quinta-feira, 25 de novembro de 2010

POESIA - DESAFIO - Jaci Bezerra Lima

Jaci Bezerra Lima


DESAFIO



A palavra é uma onda

aguardando o massacre,

e, antes que se esconda,

além de áspera, acre.



Nessa forma de ser

é fruto para a fome,

doendo sobre a pedra

que é e faz o homem.



A palavra é um pássaro

trinando a dura mágoa

do homem que no sáfaro

verão é pedra e água.



Nessa forma, uma porta

para amplas paisagens,

ser que é mapa e que é rota

para a exata imagem.



A palavra é uma caixa

de pássaros ardendo,

ser que a si não se basta

se é um pássaro morrendo.



Nessa forma, a lembrança

do dia, não o dia,

ser que a mão não alcança,,

frágil caixa vazia.



A palavra é um peixe,

luz de luzida escama,

ardendo como um feixe

de trigo ou uma chama.



Nessa forma, a borracha

que o tempo não consome,

comida que não basta

à boca de quem come.



A palavra é uma pedra

sofrendo no deserto,

ser que nem sempre medra

mesmo quando está perto.



A palavra é um rio

correndo sem ter margens,

ser que é mais que um fio

de luz sobre a ramagem.



Nessa forma, um tecido

de estrelas sobre a noite,

ser que dói nos sentidos

como um soco e um açoite.



Este poema (Desafio) de Jaci Bezerra Lima foi concebido no Acre, com data de 13 de dezembro de 1979. O poeta tinha ido a Rio Branco para participar da comissão julgadora do I Festival Acreano do Filme Super 8. O poema me foi dedicado, e comigo ficou guardado por 15 anos. Em 11 de dezembro de 1994, o escritor Nelson Patriota publicou o poema no Caderno Ilustrado do jornal “O POTI”. Enviei exemplar do jornal pra Jaci, e o poeta respondeu-me com uma carta, da qual eu posto neste blog alguns trechos .

“... Recebi sua carta com as cópias do artigo e do poema. O artigo, um pequeno e lúcido ensaio, como poderia dizer o velho Gilberto, é original e envolvente, pela abordagem, pelo domínio do tema e pela linguagem. Lamento só que tenha saído truncado. Mas o que fazer? O que vale é que é um artigo bom de se ler ou, melhor, de se comer com os olhos e a sensibilidade. Quanto ao poema, confesso, como já lhe havia dito, que não me recordava do que tinha escrito. Vê-lo publicado assim, depois de tanto tempo, foi como reencontrar, comovido até, um pouco da minha mocidade. É um poema com uma forte dicção cabralina, mas creia que você me deu uma grande alegria ao publicá-lo”.

Jaci Bezerra Lima, poeta, dramaturgo, contista. Publicou entre outros livros: Auto da Renovação; Os pastos da minha lembrança; Emílio Madeira, o galo. Comarca da memória, Livro de Olinda, Livro das incandescências e Linha d' água (poesia).

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