quarta-feira, 25 de junho de 2008

CINEMA - JOHNNY GUITAR - Pedro Vicente Costa Sobrinho

Johnny Guitar

O cenário é o Arizona, território tomado pelos Estados Unidos ao México em 1848. A expansão da ferrovia em direção ao Oeste foi, na segunda metade do século 19, encurtando as distâncias e integrando demográfica e economicamente as regiões mais longínquas do solo americano. Com a ferrovia, inevitavelmente, o deslocamento para as áreas de fronteira foi intensificado. Os velhos pioneiros, pequenos, médios e sobretudo os grandes rancheiros sentiram-se ameaçados pela provável chegada da leva de migrantes e fazendeiros do Leste, vindos no rastro dos caminhos de ferro. O conflito entre os interesses locais e o progresso instaurou-se.
Vienna (Joan Crawford) instalou seu cassino num lugar estratégico, passagem da via férrea, onde, com a construção da estação, com certeza nasceria um novo núcleo de povoamento, colocando em risco o poder até então inquestionável dos McIvers e Small, maiores rancheiros da região.
A seqüência inicial desenvolve-se no interior do cassino, onde Emma Small (Mercedes McCambridge), acompanhada por McIvers e pistoleiros, acusa Vienna de proteger Kid Dançarino (Scott Brady) e seus comparsas, supostos assassinos do seu irmão. O diálogo áspero entre as duas mulheres é esclarecedor, revelando, para além dos interesses econômicos em jogo, um conflito de natureza afetiva envolvendo uma triangulação amorosa: Emma, Kid e Vienna. Emma, na sua paixão desenfreada e não correspondida por Kid, sequer aceita por ela mesma, é uma personagem psicótica cujo ódio move-se na direção da destruição dos seus rivais.
A chegada de Johnny Guitar (Sterling Hayden), forasteiro convidado por Vienna para trabalhar em seu cassino, acrescentou novos ingredientes à trama. Johnny Logan, seu verdadeiro nome, é um pistoleiro lendário, cuja coragem, pontaria e rapidez no gatilho eram conhecidas em todo o Oeste. A vida arriscada e violenta que levava o afastara de Vienna, sua ex-amante, que não estava disposta a sacrificar o sonho de ter um lar e uma família. Depois de cinco anos reencontraram-se e, apesar dos diálogos cáusticos e ríspidos iniciais, estariam dispostos a recomeçar; Vienna estava determinada a realizar seus objetivos sem que para isso fosse necessário o uso da violência. Sua personalidade forte impunha respeito a seus adversários. O inusitado assalto ao banco feito por Kid Dançarino altera seus planos, pois dera a Emma e McIvers o motivo que necessitavam para incitar os rancheiros a prendê-la como cúmplice do crime.
O enredo tem como desfecho o reencontro das personagens principais em conflito: Johnny Guitar (agora Logan), Kid Dançarino, Emma e Vienna, envolvidos num duelo no qual a morte dos oponentes era a única saída.
O diretor Nicholas Ray tomou como pretexto o gênero western para realizar uma das obras-primas do cinema, em particular do próprio western. A condução é segura, sóbria e despojada, não havendo espaços para filigranas. As personagens centrais são bem construídas e delineadas. Vienna e Emma, sem dúvida, serão sempre tipos de referência na história da arte do filme. Os elementos da estrutura dramática se mesclam numa narração cinematográfica irretocável.
A natureza do cinema como arte coletiva é realçada pelo equilíbrio e harmonia dos seus componentes. O desempenho da atriz Joan Crawford, personagem central, é antológico. A fotografia correta de Harry Stradling e o roteiro de Philip Yordan imbricam-se à trilha musical do notável compositor e maestro Victor Young. O público jamais se esquecerá da canção Johnny Guitar, interpretada por Peg Lee, que se associou intimamente ao motivo condutor da trama.

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