sábado, 6 de outubro de 2012

Memórias. Varal das Lembranças: O que não esqueci sobre Projeto de uma Coleção Acreana - Pedro Vicente Costa Sobrinho


 
Três livros clássicos sobre o Acre publicados nas Coleções Reconquista do Brasil, Brasiliana e Documentos Brasileiros.

 
No ano de 2008, fui convidado pelo governador do Acre, Binho Marques, para prestar assessoria em três projetos: Bienal do Livro, instalação de uma Pinacoteca e do Complexo de Cinema e Teatro Recreio. Acabei me envolvendo em outras atividades conexas, tais como projetos de animação cultural, formação de platéia, regulamentação para uso de espaços culturais, inclusive o de uma Coleção Acreana, biblioteca básica para se conhecer o Acre e os acreanos. O projeto exigiu certo esforço de pesquisa para que seus fundamentos fossem convincentes junto aos gestores da política cultural no estado. A iniciativa de certo modo andou bem, pois foi atribuído à Biblioteca Pública Estadual o gerenciamento do projeto, definiram-se também os nomes da Comissão Executiva Editorial e, por sua vez, fez-se a sugestão dos nomes para constituir o Conselho Editorial. Além disso, realizou-se a licitação, de abrangência nacional, para escolha da empresa gráfica ou editora para executar os serviços de impressão das primeiras obras a serem publicadas. O empenho dos valores, salvo engano, para fazer face às despesas iniciais de edição foi feito, pois havia recursos no orçamento daquele ano, e já também havia recursos alocados para o próximo exercício. Fiz contato inclusive com o grande artista gráfico Victor Burton para que ele viesse a projetar capas e miolo padronizados dos livros da coleção. A mudança ocorrida na Fundação Elias Mansour, com a posse do novo governo e, portanto, com a indicação de um novo gestor da cultura, tudo faz crer que o projeto foi circunstancialmente adiado. Para que esse projeto não fique no anonimato e esquecimento macondiano eu estou postando ora em meu blog. Fiz alguns acréscimos na listagem inicial de obras a serem editadas, acatando-se algumas sugestões de obras  recolhidas  quando se estava ainda na  finalização do projeto. Aí está o projeto na sua versão inicial, então leia, critique e divulgue...

 

Considerações Iniciais

 

A formação de bibliotecas básicas com obras de referência para o conhecimento do Brasil e dos brasileiros foi um objetivo perseguido pelos grandes editores nacionais nos anos de 1930. Para que fosse alcançado esse objetivo as maiores editoras mobilizaram nomes, a época, dos mais representativos da chamada inteligência brasileira, tais como Gilberto Freyre, Fernando Azevedo, entre outros, para assumirem a direção intelectual dessas coleções. A organização de coleções temáticas e gerais foi o modelo editorial encontrada para viabilizar o projeto que se propunha registrar e revelar os aspectos mais variados da cultura e realidade nacionais, e daí, então, as muitas coleções que circularam pelo país sob a forma de livros. Realce-se, todavia, que só algumas delas conseguiram conquistar o estatuto de permanência no curso da história do mercado editorial brasileiro.
 
Das muitas coleções organizadas destacamos ora quatro delas, pois foram decerto as mais representativas pelo conteúdo dos livros editados, pelo valor como referência bibliográfica e também por sua continuidade editorial. A representatividade e penetração dessas coleções podem ser mais bem avaliadas pelo muito que já se escreveu sobre elas, e pelo valor que elas adquiriram no mercado de livros raros. Muitos são os colecionadores e bibliotecas que procuram os títulos que nelas foram publicados. Vejamos.
 
Por iniciativa do ex-sócio do escritor Monteiro Lobato, o editor Octalles Marcondes Ferreira, proprietário da Companhia Editora Nacional, foi proposto o primeiro grande projeto editorial do mercado livreiro (1931): Biblioteca Pedagógica Brasileira, que tinha como objetivo à formação de uma biblioteca básica sobre o Brasil. Para coordenar esse projeto, o editor Octalles Marcondes convidou inicialmente o cientista Fernando Azevedo, um dos intelectuais mais respeitados do país, e que, anos depois, veio a participar do projeto de criação da Universidade de São Paulo – USP. Depois dele, a Biblioteca foi dirigida pelo historiador Américo Jacobina Lacombe. Da biblioteca básica fazia parte uma coleção denominada Brasiliana, que ganhou autonomia e se tornou a mais importante e representativa das coleções até hoje organizadas no Brasil.
 
A Coleção Brasiliana teve início em 1931, com permanência no mercado editorial até os anos de 1980. Mais de 300 títulos, salvo engano, foram publicados com a sua chancela. Tornou-se raridade no mercado de livros, e é bastante cobiçada por colecionadores, bibliófilos e bibliotecas, no país e exterior.
 
A Coleção Documentos Brasileiros, por sua vez, foi criada pelo editor José Olympio e editada pela José Olympio Editora. O projeto editorial foi iniciado em 1936, sob a direção do sociólogo Gilberto Freyre, que já havia publicado com a marca da editora seus dois grandes livros: Casa Grande e Senzala e Sobrados e Mocambos. A citada coleção teve dois outros ilustres diretores: Octávio Tarquínio de Souza e o chanceler Afonso Arinos de Mello Franco. A “Coleção Documentos Brasileiros” editou cerca de mais de 200 títulos. No ano de 1986, o Governo do Acre, através da Fundação Cultural, em coedição com a José Olympio Editora, editou o livro Um paraíso perdido. Ensaios, estudos e pronunciamentos sobre a Amazônia, de Euclides da Cunha. O livro, que recebeu o n. 206 da coleção, foi organizado, com introdução e notas, por Leandro Tocantins.
 
A Coleção Biblioteca Histórica Brasileira foi  de menor duração, porém de prestigiado reconhecimento pelo seu valor e peso intelectual. A iniciativa foi do editor e livreiro João de Barros Martins, e de sua empresa Livraria Martins Editora. Os primeiros volumes da coleção datam de 1940, indo até aos anos de 1952. Publicou pouco mais de 20 títulos, sob a direção do famoso bibliotecário e bibliófilo Rubens Borba de Moraes, autor da monumental Bibliographia Brasiliana, editada em língua inglesa. Os livros editados sob a orientação de Rubens Borba de Moraes até hoje são referencias obrigatórias para o conhecimento do Brasil.
 

Outras coleções poderiam ser lembradas por sua importância política e pedagógica, tais como Os Cadernos do Povo Brasileiro, da Editora Civilização Brasileira; e a Coleção Primeiros Passos, da Editora Brasiliense. No entanto, a Coleção Reconquista do Brasil, editada pela Editora Itatiaia, Belo Horizonte (MG), pelo seu reconhecido valor cultural, diversidade de títulos e permanência editorial, merece maior destaque entre as grandes coleções. Os primeiros livros da coleção foram editados, salvo erro, a partir dos anos de 1960. A coleção foi  dirigida até o volume 92 pelo cientista Mário Guimarães Ferri. Sua existência prolonga-se até os dias atuais. Publicaram-se duas séries iniciais; a primeira com 60 volumes e a segunda com mais de 150 volumes. A terceira, dita especial, vem editando títulos inéditos na coleção e já está, salvo engano, com mais de 10 volumes.

 
No ano de 1989, por iniciativa da Fundação Cultural do Acre,  foi editado  o volume 152 da referida coleção: Reconhecimento do rio Juruá (1905), do General Belarmino Mendonça, em coedição com a Editora Itatiaia. A edição foi fac-similar, com farta e competente introdução e notas do historiador Leandro Tocantins.   

 
Iniciativas pioneiras de editores tais como Monteiro Lobato, Octalles Marcondes, José Olympio, João de Barros Martins, Caio Prado Júnior (Brasiliense) Henrique Bertaso (Globo) e Enio da Silveira (Civilização Brasileira), para falar dos mais merecidamente lembrados, são muito raras nos dias de hoje. O exemplo atual de editor de talento cabe, com raras exceções, ao comerciante de “best-seller”, farejador de escritores medíocres, mas que vendem muito para um público talvez ignorante e subletrado. E daí, a qualidade literária da obra e mesmo sua importância real para estudo e pesquisa são secundarizadas por esses editores, cabendo, portanto, ao poder público e a Universidade arcar com a responsabilidade de colocar a disposição do público-leitor as obras de referência para o conhecimento do Brasil e dos brasileiros. Neste contexto, a institucionalização de uma Biblioteca Básica Acreana assume a maior relevância, e mesmo tornando-se imprescindível para o conhecimento da realidade e história do Acre e dos acreanos. Cabe, portanto, ao Governo do Acre, através da Fundação Cultural Elias Mansour, viabilizar o projeto de uma Coleção Acreana, criando as condições para que dezenas de obras de referência sobre o Acre sejam editadas ou reeditadas.

  

Propostas preliminares para editoração da Coleção Acreana

  

 Identificação e objetivo
 

 A Coleção Acreana tem por objetivo a constituição de acervo bibliográfico com obras de referência que contribuam para o estudo e conhecimento do Acre e dos acreanos, através da publicação e/ou republicação, sob a forma de livro, de estudos, pesquisas, relatos de viagem, memórias, biografias, em síntese: obras artísticas, literárias e científicas de natureza geral.

 

Da direção
 

A “Coleção Acreana” será dirigida por uma Comissão Executiva Editorial composta por três pessoas, com mandato renovável de dois anos, por designação, através de portaria, do  Presidente da Fundação Cultural Elias Mansour.  A Comissão Executiva Editorial, por sua vez, terá as seguintes atribuições: a) Selecionar as obras que serão editadas na coleção; b) Escolher, quando necessário, o organizador para o material a ser publicado; c) Providenciar junto à Biblioteca Pública Estadual a devida ficha catalográfica da obra a ser editada, d) Normalizar os originais ou obras para publicação de acordo com as normas e disposições da ABNT e da Fundação Biblioteca Nacional (ISBN/ISSN); e) Providenciar a revisão de ortografia e linguagem dos textos selecionados; f) Fazer entrega dos originais devidamente preparados (miolo, orelhas, quarta capa, título, autor, ficha catalográfica, ISBN etc.) para diagramação e finalização  do arquivo a ser impresso em gráfica ou editora.
 

Do Conselho Editorial


A Coleção Acreana terá um Conselho Editorial composto de 9 (nove) membros, com as seguintes atribuições: a) Analisar, avaliar e emitir parecer sobre os originais que lhe forem encaminhados pela Comissão Executiva Editorial; b) Solicitar parecer de consultor ad hoc na hipótese de se considerar incapacitado para julgar determinado original. c) Sugerir à Comissão Executiva Editorial, a inclusão de  obras científicas ou literárias, já editadas ou não, para que façam parte  da Coleção Acreana.

 
Formato e capa

 
 Os livros publicados na “Coleção Acreana” serão impressos no formato 16  por  23 cm, com mancha gráfica de 12 por19 cm, incluindo-se a numeração da página, que será posta no canto esquerdo (par) e direito (ímpar). A capa e o miolo dos livros deverão ser projetados por artista de reconhecido valor no campo da editoração gráfica, e padronizados para todas as publicações, com exceção dos álbuns de arte. 
 

Das tiragens
 

Os livros publicados na “Coleção Acreana” terão tiragens econômicas de dois mil exemplares, podendo variar para mais ou para menos de acordo com as expectativas de mercado com relação aos títulos publicados. 
 

Da distribuição
 

Os livros publicados na “Coleção Acreana” serão distribuídos; a) Gratuitamente para as redes de bibliotecas públicas, municipal e estadual, bem como para bibliotecas escolares das redes públicas de ensino estadual e municipal;  b) Postos à venda no mercado local e nacional  através da FEM; c) Parte da tiragem será reservada para intercâmbio com a rede nacional de bibliotecas públicas e universitárias, através do serviço de intercâmbio da Biblioteca Pública Estadual
 

Dos trabalhos de editoração e impressão
 

O trabalho de editoração dos livros da “Coleção Acreana” será realizado por serviços de terceiros: preparação de textos, digitação, revisão de originais e provas, ilustração, diagramação, formatação e finalização do arquivo para impressão do miolo e capa.

O trabalho de impressão e acabamento dos livros deverá ser realizado por gráficas especializadas no ramo, ou através de coedições com editoras públicas ou privadas.
 

Das reuniões da Comissão Executiva Editorial e Conselho Editorial

 
As reuniões da Comissão Executiva Editorial devem se realizar mensalmente ou de acordo com cronograma definido por seus integrantes, conforme as necessidades do trabalho. O Conselho Editorial, por sua vez, reunir-se-á quando convocado pela Comissão Executiva Editorial.

 

Relação  de títulos considerados essenciais para constar do acervo inicial da Coleção Acreana:

 

A Gazeta do Purus. Antonio José Souza Loureiro;

Reconhecimento do rio Juruá (1905). General Belarmino Mendonça;

Um paraíso perdido: ensaios, estudos e pronunciamentos sobre a Amazônia. Euclides da Cunha;

Estudo Geográfico do território do Acre. Antonio Teixeira Guerra;

Formação Histórica do Acre. Leandro Tocantins;

Plácido de Castro. Um caudilho contra o imperialismo. Cláudio de Araújo Lima;

Organização dos relatos de Constant Tastevin sobre os rios Juruá, Muru, Tarauacá; e sobre os índios das bacias dos rios Purus, Juruá e regiões limítrofes, este último com a colaboração P. Rivet;

Álbum do rio Acre. Emílio Falcão;

A conquista do deserto ocidental. João Craveiro Costa;

Os seringais. Mário Guedes;

Amazônia. O papel decisivo do Mal. Taumaturgo de Azevedo na questão do Acre. Manoel Onofre;

Apontamentos sobre o rio Juruá. W. Chandless;

A presença do Capitão Rego Barros no Alto Juruá (1912-1915). Glimedes Rego Barros;

Índios Caxinauá – seringueiro caboclo a peão acreano. Terri Vale de Aquino.

Organização dos artigos de José Moreira Brandão Castello Branco: Importância dos rios acreanos na história e geografia do Acre; Afluentes do rio Juruá. O rio Purus e seus afluentes.  O rio Abuña e o rio Javari; Comunicação sobre o território do Acre – tentativa de desbravamento da região do Acre; Terra e gente do Acre; O Juruá Federal. Território do Acre; Cartografia acreana. Caminhos do Acre; Descobrimento das terras da região acreana; Acreânia.

Acre: prosa e poesia (1900-1990). Laélia Rodrigues da Silva;

A represa. Océlio Medeiros;

Reunião dos romances: Terra caída, Vidas marcadas e Do seringal ao asfalto. José Potiguara;

Certos caminhos do mundo – romance do Acre.  Abguar Bastos;

Deserdados. Romance da Amazônia. Carlos de Vasconcelos;

Quixadá de fazenda a cidade. José Bonifácio de Souza;

A Conquista do Acre. Pimentel Gomes;

Os imperadores do Acre – Uma análise da recente expansão capitalista na Amazônia.  Marcílio Ribeiro Sant’ana;

A epopéia do Acre. Sílvio de Bastos Meira;

Coronel de barranco. Cláudio de Araújo Lima;

O sertanejo, o brabo e o posseiro: a periferia de Rio Branco e os cem anos de andança da população acreana. Luiz Antonio Pinto Oliveira;

O seringal e o seringueiro. Arthur Cezar Ferreira Reis;

Conflitos pela terra no Acre: a resistência dos seringueiros de Xapuri. Élio Garcia Duarte;

Por que perdemos a batalha da borracha. Cosme Ferreira Filho;

Organização dos materiais da FUNAI, da Comissão Pró-Indio, do CIMI-Acre e principalmente do antropólogo Terri Vale de Aquino, sobre os índios do Acre;

Reunião em livro de todas as entrevistas concedidas por Chico Mendes;

O barão de Rothschild e a questão do Acre. Luiz Alberto Moniz Bandeira;

O Palácio de Juramidan. Santo Daime: um ritual de transcendência e despoluição. Clodomir Monteiro da Silva;*

Seringal. Miguel Ferrante;

Peru versus Bolívia. Euclides da Cunha;

Arquivos do Galvez que se encontram no Instituto Arqueológico, Histórico e Geográfico de Pernambuco (IAHGP).

 

 

* Haja vista a repercussão nacional alcançada pela questão do Santo Daime, e sobretudo pela qualidade e relevância do texto do escritor  Clodomir Monteiro da Silva, sugere-se que seu trabalho seja o primeiro livro a ser editado pela Coleção Acreana.

Nota: Se não me esqueci, os nomes sugeridos para Comissão Executiva Editorial foram Helena Carloni, Diretora do Sistema Estadual de Bibliotecas, Laélia Maria Rodrigues da Silva, professora Dra. da UFAC, e o jornalista Elson Martins da Silveira.

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