Rio de Janeiro, início de 1971. “O
Prestes mandou me chamar para uma conversa. Ele está saindo do país por esses
dias. Vou ao encontro dele agora. Não sei a que horas volto para casa.”
Quem assim se expressava era meu pai,
jornalista e militante comunista Ivan Alves, pouco antes de um encontro com o
Camarada Prestes, O Velho, como os companheiros do Partido Comunista Brasileiro
carinhosamente o chamavam.
Prestes era, então, o mítico
secretário geral do PCB. Não nego que meu pai estivesse um pouco apreensivo.
Natural. Mas sentia-se emocionado, ao mesmo tempo, pela confiança que Luiz
Carlos Prestes depositava nele. Percebi isso em todo caso. Os dois homens se
conheceram ainda nos anos 50, no Rio de Janeiro. Com o Golpe de 64, ficara
difícil para eles se manterem em contato. De qualquer maneira, estavam os dois
irmanados no PCB, o Partidão. No mais, vida que segue, como diria o saudoso
João Saldanha, outro membro do Partido.
Ao que eu saiba, foram dois encontros
naquele mesmo ano de 1971, ambos reservadíssimos. Também pudera: Luiz Carlos
Prestes era o homem mais procurado do Brasil. Simples assim. O que os serviços
de informação e repressão da ditadura militar não dariam para capturá-lo! O
velho Prestes passara praticamente toda sua vida na cadeia, no exílio ou,
ainda, na clandestinidade. E isso desde 1924, quando lançara a sua Coluna
Invicta, percorrendo cerca de 27 mil quilômetros pelo território brasileiro, em
sua marcha guerrilheira. O mínimo que se poderia dizer sobre ele é que Prestes
era um desses homens de fibra incomum, forjado nas lutas travadas pelo nosso
povo ao longo do século XX. Um revolucionário extremamente coerente, nunca é
demais lembrar. Impossível não admirá-lo, independentemente do nosso
posicionamento político, até. O militante de dedicação exemplar forçava a nossa
estima e o nosso reconhecimento.
Mas...como era mesmo o homem Luiz
Carlos Prestes na intimidade, no dia a dia? Quais suas angústias, seus receios
e, mesmo, frustrações? Seus sonhos mais comuns, enfim? Pouquíssimas pessoas
poderiam responder a perguntas como essas. Uma delas se chama Maria Prestes, ou
mais precisamente a militante comunista Altamira Rodrigues Sobral, sua
companheira por cerca de 40 anos. E foi o que ela fez, em seu belo relato “Meu
companheiro” (3ª edição, versão bilíngue, em português e espanhol, Editora
E-papers e Editora Anita Garibaldi). Emana das páginas deste livro tanto a luta
obstinada da sertaneja Altamira — filha de um respeitado comunista — por seus
ideais quanto a figura humana de Luiz Carlos. Sim, Luiz Carlos. Afinal, o ser
humano precede o revolucionário. Mais: ele o explica, eu diria. Prestes é
Prestes porque é também Luiz Carlos. Precisamos conhecer o último, se queremos
de fato conhecer o primeiro. Homens também são histórias.
Essa nova edição — a terceira, por
sinal — do livro de Maria Prestes é especialíssima. Não só pelas novas
revelações que traz, mas, sobretudo, por se destinar ao público
latino-americano. Aquele que Pablo Neruda considerava um dos maiores comunistas
e combatentes das Américas poderá, a partir de agora, ser melhor conhecido dos
latino-americanos em geral. Nada mais justo. Afinal, Prestes lutou pela
libertação do homem, seja qual for a sua nacionalidade. Isto é, era um
internacionalista, que via, para o bem e para o mal, na União Soviética a
pátria dos trabalhadores de todo o mundo. Além do que, após a marcha da Coluna,
em 1927, ele se internou na Bolívia, residindo ainda por alguns anos na
Argentina. E, como todo gaúcho de quatro costados, mantinha vínculos sólidos
com a cultura hispânica. Talvez por isso o livro esteja sendo lançado, quase
que simultaneamente, em Bogotá, no Rio de Janeiro, em São Paulo, Brasília,
Porto Alegre, Montevidéu, Buenos Aires e Santiago do Chile. Uma marcha quase
tão longa quanto aquela da Coluna Prestes, logo se vê...
Vale dizer, Luiz Carlos Prestes era,
como todos nós, brasileiros, um cidadão de Nuestra America. O que destacar
ainda? Isso, talvez: é importante que todas as pessoas conscientes leiam este
relato de Maria Prestes — e com ele alojem em seus corações uma parte da
História aguerrida e, também, afetiva do nosso sofrido subcontinente.
Ivan Alves Filho: jornalista e escritor; colaborador da Fundação Astrojildo Pereira. Publicado no jornal Algo a Dizer, edição de junho de 2012.
Um comentário:
Eu realmente gosto da obra de arte, mas a maioria eu gostaria de vê-los ou apreciá-los como tal. Então, na minha restaurantes em sp, eu tenho uma grande variedade de obras dispostas nas paredes para que as pessoas tenham uma noite agradável enquanto se come.
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